sábado, 26 de setembro de 2009

Com Quem e Onde Aprendemos a Viver?

"Leda e o Cisne" (1599) - Peter Paul Rubens


De Repente, uma Senhora Triste

Marco Túlio de Urzêda Freitas

Sempre que saio à noite da faculdade, volto para casa irritado. Ah nem, você acaba de dar aula às oito e quarenta da noite, cansado, e ainda tem que pegar um ônibus que demora quase uma hora para passar ... Vou te contar, viu?! Agora, quando volto mais cedo, a história é outra: sinto vontade de sorrir, sei lá ... de ver as coisas mais de perto, pelo menos. Gosto de admirar a paisagem do campus onde estudo. Tudo muito tranquilo. Tudo muito verde. Começo, então, a fazer planos, a pensar na vida, nos problemas ... a sonhar intensamente. Acordado.

Ao entrar no ônibus, tiro a mochila das costas e logo procuro um lugar para me sentar. Já "confortável", ensaio várias vezes a leitura de um livro, mas quase sempre acabo me deixando levar pela necessidade da reflexão, do silêncio. Por isso, raramente presto atenção nas pessoas que entram depois de mim, se estão alegres, amarguradas, angustiadas, enfim, se estão de alguma forma ... vivas. Tudo bem, sei que isso denota um certo egoísmo de minha parte, mas ... quem às vezes não sente vontade de ficar sozinho e de não olhar para os lados?

O fato é que nesta semana me aconteceu algo muito estranho, algo que me fez repensar essa postura de total alheamento em relação aos outros. Estava eu quieto, como de costume, lendo (olha só que proeza para quem sempre acaba trocando a leitura pelo silêncio reflexivo!) em uma das últimas fileiras do ônibus, quando alguém se sentou ao meu lado. A princípio, nem percebi que se tratava de uma senhora com idade para ser minha avó.

Depois que ela passou, não lhe dei mais importância. De repente, vi que ela estava conversando comigo, me contando algo ... Nossa, mas como achei isso estranho e ... desconfortável! Continuei lendo meu livro, pois não estava muito disposto a conversar. Mas ela insistiu me dizendo que havia acabado de sair do médico e que dessa vez ela conseguiria parar de fumar. Quando curvei meu rosto para olhá-la ... meu Deus, mas que semblante triste! Naquele mesmo instante, me senti cansado e ... cheio de culpa por não ter dado atenção à uma pessoa que sofria tanto, que talvez precisasse como nunca ouvir uma palavra de apoio, de cuidado.

Acho que nunca vi uma expressão mais triste em toda minha vida. Me senti no dever de não apenas escutá-la, mas de fato falar com ela, dar minha opinião ... algo de ... não sei ... de um jovem amigo, de um filho, de um neto. Ela continuou dizendo que já havia tentado abandonar o cigarro várias vezes, mas que todas as suas tentativas haviam fracassado. Eu fiquei pensando ... "O que dizer?!" Acabei conversando mesmo com ela, dizendo que essa fase iria passar, que Deus estaria ao seu lado para lhe dar forças (pois vi que se tratava de uma senhora religiosa), que o importante era se dar conta de que é preciso lutar para superar essas barreiras da vida etc. E ela disse mais ou menos o seguinte: "É, meu filho, agora tem que dar certo, pois se não der ... bato as botas".

Agora, me pergunto: Por que temos a tendência de evitar as pessoas? Por que somos tão ... individualitas, a ponto de não percebermos um pedido de ajuda? Por que não olhei para essa senhora no exato momento em que ela se sentou ao meu lado? De uma coisa estou certo: estes quinze minutos foram de uma aprendizagem sem tamanho. Acho que as reflexões de um mês não me seriam tão valiosas quanto essa conversa. Por fim, a senhora se levantou para descer do ônibus. Engraçado isso, não é?! Chamo-a de "senhora" porque não sei o seu nome, e nem ela o meu. Olha que coisa! O ponto mais alto desse dia foi quando ela me olhou com ternura e sorriu, como se com este sorriso ela quizesse expressar algo de ... gratidão. Parecia mais feliz. E eu ... de certo modo, renovado e disposto a olhar os outros mais de perto.

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